Colunista - Alan Rodrigues

Drogadição

Por Alan Rodrigues

14/08/2017

Dia desses, indo de Lafaiete para Cristiano Otoni, conversava com o Marcelo, um amigo meu, que é alguns anos mais novo. Em determinado ponto da conversa, começamos a falar sobre o prefeito de São Paulo, João Doria, e o episódio que ocorreu na Cracolândia. Dessa forma, tive a ideia de escrever sobre o tema, que é muito controverso: muitos aplaudiram e aplaudem as atitudes do prefeito, outros como eu e acredito também que a maioria dos profissionais de saúde olha com cautela e certo descontentamento, uma vez que somos pautados por todo um contexto de saúde.

O uso de drogas nos dias de hoje chega cada vez mais cedo nas famílias independente se ricas, de classe média ou pobres. Falar sobre o uso de drogas, assim como as ações de João Doria, é algo extremamente delicado, complexo e histórico. Isto porque devemos analisar os vários contextos ou fatores de risco que estão envoltos tais questões, como sociedade, escola, amigos, família entre outros. Tais fatores podem ser melhor explicados como sendo aqueles que acontecem antes do uso indevido de drogas.

As drogas e o vício exercem um poder imenso sobre o dependente químico, uma vez que o vício atinge o cérebro e dessa forma, não é uma questão simplesmente de força de vontade. O vício deve ser tratado como uma doença. O primeiro contato com as drogas é sempre voluntário, mas com o passar do tempo não é apenas uma questão de escolha. Estudos apontam que a parte do cérebro atingida pelas drogas é a que controla as decisões dos dependentes. Este olhar do vício como doença é que precisa ser incutido na mentalidade das pessoas, principalmente naquelas mais fervorosas que culpam somete o dependente químico.

Voltando a conversa que tive com meu amigo, vejo que as atitudes que Doria teve, se resumem na expressão “enxugar gelo”. A questão da drogadição é uma questão de Saúde Pública. Sim! Saúde Pública!

A internação compulsória de usuários só é permitida hoje em casos especiais, e com medidas adequadas. Isto é baseado em consensos médicos, jurídicos e técnicos. A Organização Mundial de Saúde (OMS), órgão de grande respeito mundialmente, também considera inadequada e ineficaz a internação compulsória. No Brasil, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) e a Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn) se manifestaram contra as ações de Doria. Em nota, a ABEn menciona que “a enfermagem constitui a maior parcela de profissionais na área da saúde e atua na perspectiva do cuidado integral e individualizado a pessoas que vivenciam sofrimento mental e/ou fazem uso problemático de álcool e outras drogas”.

Atualmente no Brasil, há uma rede de programas e serviços, denominados de Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), que foi instituída pela Portaria GM/MS nº 3.088/2011 e juntamente com a Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas é orientada pelas diretrizes da Reforma Psiquiátrica e da Lei nº 10.216 /2001.

Dentre os objetivos da RAPS, temos:

  • Ampliar o acesso da população em geral;
  • Promover o acesso das pessoas com transtornos mentais e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas e suas famílias aos pontos de atenção;
  • Garantir a articulação e integração dos pontos de atenção das redes de saúde no território, qualificando o cuidado por meio do acolhimento, do acompanhamento contínuo e da atenção às urgências.

Centros de Atenção Psicossocial (CAPS)

Os Centros de Atenção Psicossocial, são instituições brasileiras, gratuitas, que tem o papel de cuidar de pessoas que sofrem de transtorno mentais, e que oferecem cuidados comunitários feitos por uma equipe multiprofissional, composta por médicos, enfermeiros, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais, entre vários outros profissionais, que atuam sob uma ótica interdisciplinar, atendendo pessoas com transtornos mentais graves e persistentes e também pessoas com sofrimento ou transtorno mental em geral, incluindo aquelas com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, seja em situações de crise ou nos processos de reabilitação psicossocial. Os CAPS também são um lugar de referência e de cuidado promotor de vida que tem a missão de garantir o exercício da cidadania e a inclusão social de usuários e de suas famílias.

Comunidades Terapêuticas

Estas ao contrário do CAPS, são instituições privadas, sem fins lucrativos e financiadas, em parte, pelo poder público, que oferecem gratuitamente acolhimento para pessoas com transtornos decorrentes do uso, abuso ou dependência de drogas. No entanto, há que se ter cautela na escolha de uma comunidade terapêutica, visto que algumas dessas comunidades fogem do que se propõe e tem tratamentos duvidosos e desumanos.

Na cidade de Conselheiro Lafaiete temos o Centro de Atenção Psicossocial – Álcool e Droga (CAPS AD) e o acolhimento no local se faz até as 16h.  Em nossa região, há a Comunidade Terapêutica Bom Pastor, que é referência na área para a recuperação de pessoas portadoras de dependência química, seja ela álcool e/ou drogas.

Dessa forma, com a RAPS, CAPS dentre outros serviços, como as comunidades terapêuticas, podemos ver preconizado o atendimento a pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, de forma mais humana, com a garantia de direitos, o respeito à dignidade, reduzindo danos, promovendo a autonomia, buscando a sua inclusão social e sem o caráter higienista feito em São Paulo, que lamentavelmente, muitos tem aplaudido.

O vício leva à perda de emprego, problemas financeiros e judiciais, conflitos familiares, e sim, problemas de saúde, entre vários outros (e são muitos). O melhor trajeto para que nossos filhos e amigos não se enveredem para esse caminho, é sempre a prevenção e informação, seja no ambiente familiar e escolar, que é primordial, seja em toda sociedade. 

E fica aqui meu recado para os pais: conversem com seus filhos, dê muito amor e também limites tanto dentro quanto fora de casa. E se você está passando por problemas com drogas, ou tem algum familiar ou conhecido nunca é tarde para pedir e também para receber ajuda:

- CAPS-AD Lafaiete: Rua Benedito Alves Vieira, nº 1005, Bairro São Dimas. Telefone: 31 3769 2662.

- Comunidade Terapêutica Bom Pastor: Rua José Joaquim Queiróz Júnior, nº 246, Bairro Pioneiros, Ouro Branco/MG. Telefone: 31 3742 1445.

Liguem e informem-se!

 

Alan Rodrigues é Enfermeiro, pós-graduado em Gestão de Saúde, Formação Pedagógica e Saúde da Família. É mineiro, apaixonado por Minas; apoiador de causas sociais; adora escrever e ver séries, além de um bom papo e um cafezinho da roça.